quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

A chuva e eu

Cá estou eu de volta ao meu refúgio virtual num momento inusitado: sentada na cadeira de frente para o computador e completamente encharcada. Isso porque a chuva me pegou no meio do caminho, quando voltava de um encontro com uma amiga.

O engraçado é que eu sempre carrego um guarda-chuva comigo (mesmo que faça um sol escaldante!) porque eu sempre tento evitar imprevistos. No entanto, hoje, mesmo sabendo que a previsão era de chuva, eu saí desprevenida.

Poderia ter corrido na rua, como tantas pessoas fizeram. Ou me escondido e esperado a chuva passar, como preferiram outras. Mas eu não. Andei tranquilamente por toda a rua com o vestido completamente ensopado como se nada estivesse acontecendo. Isso porque aproveitei o momento para pensar. Essa chuva - que poderia ser considerada o acontecimento mais banal do mundo - me soou um presságio.

Num momento em que meu coração já estava mergulhado em tristeza, a chuva chegou para diluir um pouco o sofrimento, que eu tanto tentei evitar. Assim como eu ando sempre com um guarda-chuva, visto sempre minha armadura para me proteger na vida. Só que, às vezes, eu esqueço do guarda-chuva e, às vezes, eu tiro a armadura para deixar que as pessoas se aproximem. Um instante de descuido e o que se tentou evitar por tanto tempo acontece. É nessa hora que a chuva vem. É nessa hora que a dor chega.

O banho de chuva foi bom. Lembrou-me que o inesperado sempre acontece e que o sofrimento é inevitável. Ah, e foi engraçado também. Consegui até arrancar uma risada do meu porteiro - sempre de mal com vida - que ficou com pena de mim e me indicou um ambulante que vende guarda-chuva por R$ 5. Muito bom!

Lavei a alma e despertei um sorriso espontâneo. Ganhei o dia.

sábado, 23 de outubro de 2010

Ponto final

Eu achava que as coisas boas deveriam durar para sempre. Só as ruins deveriam passar. De preferência, bem depressa! Mas a ingenuidade há muito se foi, sem traumas. Na verdade, com a partida, tudo ganhou um brilho mais intenso. Afinal, na certeza de que tudo passa, aproveito mais, me entrego mais, sugo até a última gota.

A vida é feita de etapas. Diferentes entre si, mas igualmente importantes. Eu não fui feita para ficar parada. Nasci com asas imaginárias que não cansam de bater rumo a um destino que nem eu conheço. E o desconhecido não me assusta mais.

As pessoas precisam de movimento. Comigo não seria diferente. E, para recomeçar, é preciso pôr fim ao que passou.

Ao som "dele", um brinde às novidades em todas as áreas da minha vida!


segunda-feira, 23 de agosto de 2010

Aos que abrem os olhos, a luz

Minha vida anda louca. Louca vida. E feliz.

Neste momento, me falta tempo para escrever, escrever e escrever aqui como eu gostaria. São tantas coisas que eu queria dizer!

Mas diante dessa limitação deixo aqui apenas um pensamento sobre o qual eu tenho refletido cada vez mais: tudo é uma questão de merecimento. É preciso ser, profundamente. Evoluir. Tentar ao menos. Mudar a si pra mudar o mundo a nossa volta.

Como diria o meu amigo Nino: ah, eu acredito sim.

domingo, 1 de agosto de 2010

Tem, mas tá em falta

Faz um tempão que eu não venho aqui. Mas antes tarde do que nunca, não é?

Hoje, eu queria fazer uma pergunta: por onde anda a gentileza? Alguém a viu passar por aí? Se viu, por favor, diga que nós estamos precisando muito dela para convivermos de maneira mais harmônica. Portanto, volte já e sem demora!

Outro dia estava conversando com uma amiga aqui em casa - num momento chá da tarde (adooooro!) - e ela estava me falando sobre um carinha com quem ela tinha saído pela primeira vez. Ela disse que foi ótimo, mas que não tinha gostado de algumas coisas. Eu, curiosa por natureza, fui logo inquirindo os motivos pelos quais o rapaz teria deixado a desejar. Afinal, cá entre nós, ele é um espetáculo!

Então, ela me disse: ele abriu a porta do carro pra mim, puxou a cadeira para eu sentar no restaurante, foi todo fofo comigo!

Eu, com cara de "desculpe, não compreendi a mensagem", disparei: tá, mas me fala o que te incomodou!

Ela disse: ué, foi isso! Tanta gentileza me soou forçado. Estranho, né?

Moral da história: a gente tá tão acostumada com a grosseria alheia no dia-a-dia, que a gentileza soa mal. Pensei: que horror! É o apocalipse!


Tá, eu exagerei. O mundo não vai acabar por causa disso. Mas que é um horror, é!

Algumas teorias afirmam que esse tipo de comportamento é coisa do mundo atual: a correria, a velocidade dos acontecimentos teriam prejudicado as relações humanas, embrutecido o homem.

Eu concordo em parte. Acho que isso também está diretamente relacionado à educação. Se fosse assim, todos os velhinhos seriam gentis e amáveis. Afinal, são de uma outra época. Definitivamente, isso não é verdade.

Certa vez, vi uma velhinha xingando palavrões na fila do mercado que deixariam a falecida Dercy Gonçalves ruborizada. Recentemente, uma cena no metrô me chocou ainda mais. Quando as portas do vagão se abriram, eu entrei e me encostei na parede. Sempre viajo em pé, mesmo que haja bancos vazios. Não me pergunte o motivo. Nem eu sei.

Mas, voltando ao assunto, depois que eu entrei, uma velhinha seguiu em direção ao banco destinado a passageiros idosos. Antes que conseguisse sentar, surgiu (do nada) um velhinho. Correndo como numa maratona, ele ultrapassou a velhinha e se sentou no banco. A coitadinha ficou com uma cara de decepção! E eu, de espanto. Tanto que fiquei olhando fixamente pra ele. Ele viu que eu reparei e eu fiquei constrangida. Era pra eu olhar para outro lado, certo? Mas eu não conseguia! Continuei olhando pra ele por pelo menos umas três estações.

Enquanto eu olhava, tentava buscar argumentos que pudessem justificar aquela atitude. Será que ele estava se sentindo mal? Será que ele tem algum problema na perna? Na coluna? Será que ele não viu a velhinha? Será que ele é filho da puta mesmo?

Enfim, seja qual for o motivo, foi feio. Muito feio o que ele fez.

Saí do metrô e caminhei pela Santa Clara até chegar em casa. Durante o trajeto, fiquei pensando que só pode ter uma justificativa pra esse tipo de atitude: falta de educação, gentileza com o próximo.

Isso me fez lembrar o rapaz do mercado onde faço compras. Na primeira vez em que fui lá, perguntei pra ele se tinha leite sem lactose. Ele respondeu: tem não, senhora.

A partir desse dia, quase toda semana eu ia lá (enquanto tentava, sem sucesso, me acostumar com leite de soja... argh!). A resposta era sempre a mesma.

Até que um dia eu perguntei: moço, mas será que um dia vai chegar?

Foi então que ele revelou toda a verdade: acho que não vão comprar não, senhora.

Como na famosa pérola do comércio: tem, mas tá em falta.

Só espero que a gentileza chegue. Porque eu posso trocar de mercado, mas não posso mudar de planeta.

sexta-feira, 18 de junho de 2010

Para sempre Saramago

"Penso que não cegámos, penso que estamos cegos, Cegos que vêem, Cegos que, vendo, não vêem".
Ensaio sobre a Cegueira




Crítico ardoroso de fenômenos e injustiças sociais, ele é considerado polêmico. Em várias oportunidades, desafiou "os grandes", como a Igreja Católica, por exemplo. Consagrou-se um dos maiores nomes da literatura contemporânea. Vencedor do Prêmio Nobel de Literatura em 1998 e condecorado com o prêmio Camões (de literatura portuguesa). Nós, leitores, também fomos premiados nesta trajetória: com histórias fascinantes.

Quem me conhece sabe o quanto essas palavras significam pra mim. José Saramago é o meu escritor favorito. Para mim, um gênio da literatura. Para minha sorte, a genialidade nunca morre e sua obra para sempre será viva.

sábado, 22 de maio de 2010

Uma vez mais

Eu sempre tiro forças - não sei de onde - para uma vez mais.

Há quem diga que todas as noites são de sonhos. Mas há também quem garanta que nem todas, só as de verão. No fundo, isto não tem muita importância. O que interessa mesmo não é a noite em si, são os sonhos. Sonhos que o homem sonha sempre, em todos os lugares, em todas as épocas do ano, dormindo ou acordado.

(William Shakespeare)

terça-feira, 11 de maio de 2010

Mais do mesmo

(Para Laura Muniz)

- Ai, não sei. Tenho medo - disse ela.
- E quem disse que eu não tenho? - respondi.

Abre parênteses

Eu tenho medo do novo, mas morro de medo de ficar estagnada: presa ao velho.

Eu tenho medo de qualquer coisa sobre a qual eu não tenha controle ou desconheça.

Eu tenho medo de cometer os mesmos erros e tenho medo de sofrer.

Eu tenho medo de dar errado, mas sempre acredito que tudo vai dar certo.

Eu tenho medo de fazer más escolhas, mas esqueço completamente disso na hora de arriscar.

Tudo porque eu tenho medo de não arriscar e, um dia, descobrir que estou morta.

Fecha parênteses

- É isso aí, a vida é um risco - acrescentei.

Depois de um longo diálogo sobre os rumos de nossa existência, descobrimos que na vida dela tudo acontece por acaso. Na minha, eu busco, faço acontecer.


Mas nós duas temos medo e isso nos torna parecidas ainda que sejamos seres completamente diferentes. Afinal, todo medo é igual.

domingo, 11 de abril de 2010

Como compreender o incompreensível?

Um 'furacão' passou pelo Rio esta semana. Trouxe consigo a tragédia. O caos se instalou e as belas paisagens presentes no imaginário coletivo deram lugar a imagens de destruição. Quase cenários de guerra. A matemática foi dura: contabilizar mortos e feridos. O português mais ainda: tentar transmitir em palavras o sentimento predominante. A indescritível dor de quem já não tinha nada, mas perdeu tudo: a família.

Como os super-heróis, eu tenho uma capa protetora. Um campo magnético que utilizo sempre que necessário para trabalhar sem me envolver. Manter uma distância segura para tentar, minimamente, preservar o equilíbrio emocional. Minha fama de durona já virou lenda. Alguns chegam a dizer que sou fria. Pura bobagem. Na maioria das vezes, não demonstro. Mas sinto tudo. Sinto sempre.

Dessa vez, foi pior. Minha capa super-poderosa rasgou: deixou meu peito à mostra. O campo magnético enfraqueceu e eu - que já estava debilitada por outras razões da vida - desmoronei. Junto com os morros.

Virei madrugadas. Trabalhei 14 horas por dia. Minha roupa custou a secar: chuva misturada ao suor. Momentos de desafio e vitória na profissão. No entanto, os elogios construídos a partir da tristeza alheia não soaram tão bem quanto eu esperava. É, ao contrário do que a maioria pensa, eu não passo de manteiga derretida. Ou, como minha mãe diria, maria-mole.

Cheguei ao morro do Bumba, em Niterói, pouco tempo depois do desastre. A avalanche, o desespero, a corrida contra o tempo dos bombeiros nunca mais vão sair da minha cabeça. O barro das botas dá pra tirar, mas meu pesar nunca será esquecido.

O mundo sempre se encarrega de mostrar o quanto a vida e as relações humanas são preciosas e, ao mesmo tempo, frágeis. Às vezes, a gente esquece que tudo passa. E que o fim - ainda que temporário - pode ser agora.

Eu podia passar aqui e fazer uma narrativa do que presenciei como fiz incontáveis vezes no ar. Mas aquilo tudo era superficial. Aqui não falo de fatos, mas da subjetividade dos acontecimentos. Ainda não consigo escrever como gostaria porque sequer pude assimilar, digerir o que houve. Talvez um dia eu seja capaz. Mas, por ora, prefiro assumir minha limitação.

Só o que consigo fazer é rezar para que essas almas descansem e para que quem ficou tenha força para suportar outros dias difíceis que ainda virão.

Sim, sinto muito.

Aliás, estou exausta... de sentir.

domingo, 4 de abril de 2010

A cor do mundo

Todos dizem que odeiam mentira. Verdade.
Todos preferem a verdade. Mentira.

Bonito, inteligente e esperto. Ele era um tipo que atraía as mulheres, como se exalasse aroma de chocolate. Mas todas as investidas eram em vão. Seu relacionamento, de 4 anos, aparentava ser sólido e, por isso, muito invejado. Ele amava a namorada. Não dizia que amava da boca para fora. Amava mesmo. Amava tanto e de uma maneira tão incomum que, ao descobrir as traições (sim, eram muitas), calou-se. Sofreu, sentiu-se humilhado, mas escolheu fingir que não sabia.

Pouco antes do Ano Novo, ela rompeu o relacionamento. O término coincidiu com uma viagem que eles haviam planejado há muito tempo. Um lugar paradisíaco. Com o rosto inchado e lavado de lágrimas, ele me contou a história. E suas palavras me deixaram perplexa.

- Ela não podia ter esperado para terminar tudo depois da viagem?
- De que adiantaria? Você sofreria do mesmo jeito - argumentei.
- Eu era tão feliz! - disse ele.
- Mas não era real - rebati.
- Não importa! Isso já me bastava - disparou.

O silêncio tomou conta da sala. Desconfortante. Há momentos em que o silêncio é ensurdecedor e insuportável. Ele preferia a ilusão à verdade. Diante dessa constatação, tudo o que pude fazer foi abraçá-lo.

Esta não foi a primeira vez que esse tipo de pensamento me choca. Já ouvi muitas vezes conselhos do tipo: "deixa pra lá". Pior: "Finge que não percebeu".

Deixar pra lá é uma arte. Uma habilidade de extrema relevância para o convívio em sociedade. É a maneira mais sábia de evitar conflitos desnecessários, aborrecimentos e, até mesmo, uma gastrite.

Mas nao dá para ignorar tudo o tempo todo. Há situações graves ou importantes em que algo precisa ser dito ou feito. Às vezes, é necessário se posicionar. Faz parte do jogo. A vida não é feita só de decisões fáceis, não é? Quem me dera que meu único impasse diário fosse: comer torta de limão ou brownie com sorvete?

Eu sempre me vejo entre sucumbir ao medo ou arriscar; calar ou falar; me manter em uma zona confortável de convivência ou me posicionar; dizer sim ou não. Por mais que eu odeie me indispor com as pessoas, aprender a dizer não é fundamental.

Uma grande amiga sempre diz que minha vida é pintada em cores fortes. Verdade. Eu carrego nas tintas tanto quanto vivo intensamente. Para mim, preto e branco só serve para as fotos: momentos estáticos eternizados.

Eu sei que isso não é o ideal. Colorir o mundo com tons suaves também é uma possibilidade. Talvez a melhor.

Enquanto não encontro uma nova paleta de cores, tento evitar os borrões de tinta. Procuro resolver com clareza meus impasses mais íntimos: decidindo entre a hora de deixar pra lá e o momento de enfrentar a situação. Nem sempre acerto.

Enquanto não encontro uma nova paleta de cores, cuido da minha gastrite.

Escolha
Apesar do medo
escolho a ousadia.
Ao conforto das algemas,
prefiro a dura liberdade.
Voo com meu par de asas tortas,
sem o tédio da comprovação.
Opto pela loucura, com um grão
de realidade: meu ímpeto explode o ponto,
arqueia a linha, traça contornos
para os romper.

Desculpem, mas devo dizer:
eu quero o delírio.

Lya Luft

segunda-feira, 8 de março de 2010

Jogo rápido: permita-se

Aquela conversa aguçou meu pensamento. Que tal fugir das obviedades da vida? Um chuchu bem feitinho tem o seu valor. Não acha? Não? Eu também não achava, mas tô mudando de ideia...

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

Síntese carnavalesca


Ok, eu sei que estou voltando tarde. Mas meu cansaço absoluto de quem curte e trabalha no carnaval ao mesmo tempo me impediu. Serei rápida e objetiva porque hoje meu espírito prolixo parece ter ido dar uma volta.

Não posso deixar de registrar meu contentamento com a vitória da Unidos da Tijuca. A escola estava deslumbrante e impressionante. O desfile entrou para a história do carnaval carioca, embora eu ache que a comunidade merecia uma festa mais empolgante do que a que foi realizada na quadra. No dia da tão aguardada vitória, vender a cerveja e ainda por R$ 3,00 foi o Ó, como diria uma amiga minha.


Fiquei muito feliz também com a permanência da União da Ilha no Grupo Especial. A escola fez um desfile bonito e animado. Confesso que fiquei toda arrepiada com o público na Marquês de Sapucaí cantando o samba.

Meu pesar fica por conta da Portela que deixou a desejar e pela Viradouro que fez um desfile mambembe. Deu pena porque a gente sabe o quanto as comunidades trabalham para apresentar o melhor possível na Avenida.


Agora, o momento 'comentário-mulherzinha': o que eram Eriberto Leão e Gerard Butler desfilando? Para alegria da mulherada, os dois ficaram dando sopa por muito tempo na dispersão. Com essa visão não dá nem pra reclamar do trabalho!


E olha que eles não foram os únicos. Aliás, a Sapucaí estava bem mais interessante e menos estressante do que nos últimos anos...


Deixando de lado as brincadeiras, mas não a alegria posso dizer que o carnaval deste ano foi realmente maravilhoso.


Foto: Um dos carros da União da Ilha clicado pelo meu amigo e companheiro de trabalho Genilson Araújo.

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

Alô, Fevereiro

O céu ganha novas e repetidas cores: confetes e serpentinas levados pelo vento, acompanhados de uma estranha alegria que surge sem explicação e toma conta do corpo e da alma. Pular, sambar, brincar, sorrir. Ações inevitáveis. Encontrar quem nunca antes foi visto e reencontrar amigos que sempre estiveram presentes num movimento contínuo de exaltação da felicidade. Por estar vivo. Por estar ali. Simplesmente.



Essa época me remete à infância. As fantasias variavam: baiana, índia, odalisca. Não importa. O brilho nos olhos é o mesmo. Curiosidade diante da passagem dos bate-bolas, característicos do subúrbio da cidade. Meu irmão era um deles. Máscara no rosto, roupa colorida e espalhafatosa. Sombrinha na mão. Vê-lo se vestindo já era uma festa. Mãos sujas com molho de tomate especial do cachorro-quente feito pela mamãe. Rigorosa quanto a nossa alimentação, ela sempre foi avessa a guloseimas. Era apenas no carnaval que o quitute dava o ar da graça.



As estradas da Cacuia e do Galeão interditadas para abrir espaço para a multidão. Todos os anos, o palco montado no mesmo lugar: em frente ao supermercado favorito do meu pai (com sua antiga mania de fazer compras). Uma massa de gente sem diferenças se movendo ao som da batida do tambor. E do pandeiro. E do chocalho. Toda a bateria. Lá vinha a União da Ilha desfilar para a comunidade com a mesma empolgação da Marquês de Sapucaí, quando observada por milhares de pessoas de todos os cantos num espetáculo midiático poderoso.


É incrível perceber o poder do carnaval no inconsciente coletivo do país. Todos os problemas parecem desaparecer ainda que momentâneamente. Afinal, esse é um momento ímpar em que os pobres viram realeza numa reviravolta sociólogica. A falta de dinheiro e as dificuldades de quem 'mata um leão por dia' para sustentar a família dão lugar ao sorriso desmedido e ao suor na fantasia. Ninguém perde o compasso. O som da música dita o ritmo do coração. A dor nos pés é quase um troféu de quem sambou sem parar e não se arrepende por um segundo sequer. Eu cresci compartilhando dessa realidade. Talvez por isso até hoje escute comentários como o de outro dia: "Você deveria ser passista!". Eu acho graça e penso: e quem disse que não sou? Pelo menos de alma, sim. O samba está em mim desde pequenininha.


Aqueles dias e noites eram mágicos. Ainda são.


A expectativa para o desfile desse ano é grande. A possibilidade de acompanhar de perto o retorno da minha escola de coração à elite do carnaval carioca e vibrar também com a passagem da Portela, madrinha da União da Ilha. Duas emoções. Alegria em dobro.


E enquanto o desfile não chega, pular, cantar e sambar como quando eu era criança, acreditando que sempre é tempo de festa. O 'esquenta' começou no sábado com Imprensa Que Eu Gamo e Banda de Ipanema. Tudo bem, eu estava trabalhando. Mas até que o plantão foi bem divertido. Encontrei os amigos, desfilei, sambei. As exceções ficam para os fatos de eu não ter bebido e de, ao término da festa, quando todos ainda curtiam eu ter retornado para a redação para fechar as três matérias que tinha feito no dia e ainda ficar na apuração até às 22h30. Mas tá valendo! Embalada pela música-mantra "Alô Fevereiro", eu decreto: o meu bloco já tá na rua...


Tamborim avisou, cuidado
Violão respondeu, me espera
Cavaquinho atacou, dobrado
Quando o apito chegou, já era

Veio o surdo e bateu, tão forte
Que a cuíca gemeu, de medo
E o pandeiro dançou, que sorte
Fazer samba não é brinquedo

Todo mês de fevereiro, morena
Carnaval te espera
Querem te botar feitiço, morena
Mas também pudera

Se ele pega no teu corpo
Vai ter gente enlouquecida
Querendo entender a tua dança
Querendo saber da tua vida

sexta-feira, 8 de janeiro de 2010

A mágica da equilibrista

Andei sumida, é verdade. Não por preguiça ou falta do que dizer, mas porque estava me reencontrando. Às vezes, é bom se perder pra se encontrar, não acha? Não? Eu acho.

Ainda que tardiamente preciso registrar aqui a mágica passagem de ano: momento em que misteriosamente as palavras ganham ainda mais força e o universo conspira para que elas saltem do imaginário para o mundo real como se tivessem como único objetivo mostrar que sempre vale a pena sonhar. Afinal, como Mário Quintana gostava de dizer, esse é o mérito do ‘bendito truque do calendário’: renovar a esperança. E quem pode viver sem ela?

O ano de 2009 foi, sem dúvida, o mais desafiador. A minha casca engrossava alguns centímetros enquanto as lágrimas rolavam pelo meu rosto; meu cantar em forma de soluço ditava o ritmo do tempo; e o meu coração apertava em aflições que – naqueles momentos – pareciam não ter fim. Tive de me adaptar às bruscas mudanças na minha vida e superar os acontecimentos tristes. Mas o tempo traz consigo o distanciamento que permite que vejamos tudo com mais clareza. Ninguém consegue ler com o livro encostado no nariz. À distância, os problemas não ficam menores, mas consigo vê-los do tamanho que eles realmente são. Acho que o ser humano precisa de tempo (uns mais, outros menos) para digerir o gosto amargo das tristezas.

No final das contas, em vez de ter sido “o pior ano da minha vida”, como bradei diversas vezes, 2009 se mostrou o mais importante: abriu caminhos. Fortaleci amizades preciosas e laços de família que fazem de mim o que sou. Descobri que não se deve esperar nada das pessoas. Assim, quando algo dá errado, não há frustração. Por outro lado, os acontecimentos bons se tornam lucro incalculável. O mais importante é se permitir sempre, mas sem deixar de se proteger. Abandonei paradigmas enferrujados e me livrei de tudo que não me servia mais. De que adianta limpar os armários, as gavetas, as caixas de email para o novo ano que se inicia se não fizermos uma faxina na alma?

Depois de viver um Natal lindo em família, poucos minutos antes da meia-noite do Réveillon, falei com meus pais e meu irmão pelo telefone. Dissemos mais uma vez o quanto amamos uns aos outros; o quanto nos orgulhamos de ser uma família unida.

Rodeada de amigos, brindei o gostinho da vitória de chegar (ainda que com alguns arranhões) viva e forte após duros meses de jornada. Abandonei o branco de todos os anos: queria cor. O vestido vermelho caiu bem. Enquanto ríamos durante a virada, fazendo a contagem regressiva e estourando champagne, percebi que para mim isso é felicidade. Observando o brilho dourado dos fogos que coloriam o céu, agradeci a Deus e fiz meus tradicionais pedidos. E não é que mal 2010 bateu à porta e eles já começaram a se tornar realidade? A mágica só acontece quando se tem coragem.

A experiência do ano que se foi me deixou duas lições: tudo na vida passa e o amor vence qualquer dificuldade (ainda que isso soe utopia).

Enquanto busco o equilíbrio ideal, vou tropeçando... feliz da vida!