sábado, 28 de novembro de 2009

Pra sempre vou te amar

Ao meu companheiro de todas as horas:

Nunca pensei que esse dia chegaria. Que você me deixaria. Para sempre. São tantas as lembranças: os momentos felizes e os mais recentes momentos de dor. Nem por um instante pensei em desistir. Você também não. Lutou contra a doença como um verdadeiro guerreiro. Tenho muito orgulho de você.

Nunca vou me esquecer do seu último olhar. Os pouco mais de dois minutos que estive com você. Sinto por não ter me despedido como deveria. Mas, naquele momento, realmente acreditava que você ficaria bem novamente. O pior é que tenho a sensação de que tudo que você queria me dizer com aquele olhar era: " me leve pra casa". E eu não podia. Me perdoe.

Se você estiver ouvindo meu pensamento agora - enquanto escrevo, com lágrimas no rosto, essas palavras para desabafar - quero dizer que você foi muito importante na minha vida. Inesquecível e insubstituível. Hoje, a casa está mais vazia como nossas almas.

Eu sei que a morte é inevitável. Que tudo é uma passagem. Mas mesmo assim meu coração sangra. Meu peito dói. E a saudade é tão sufocante que mal consigo respirar.

A única certeza que tenho é que eu sempre vou te amar.


Ps: Essa foto foi feita no dia em que saiu a listagem dos aprovados da UFF (2000). Little, que me acompanhou em muitas noites em claro estudando para o vestibular, não poderia deixar de estar ao meu lado neste momento de alegria. Ele só ia dormir, quando eu fosse. Esse é apenas um dos milhares de momentos de felicidade que tivemos juntos em 11 anos de convivência.

segunda-feira, 16 de novembro de 2009

A vida...

... me engoliu num ritmo frenético e descontrolado de acontecimentos, projetos, profusão de ideias, portas que se abriram, alegria, encontros, reencontros, sustos, surpresas, constatação-óbvia-daquilo-que-apenas-eu-insistia-em-não-ver, libertação de amarras antigas já bastante enferrujadas, noites que viraram dias, dias que viraram noites, sentimentos que floresceram, paradigmas que se foram sem deixar rastro, verdades que se construíram novinhas em folha.


Acho que minha alma foi tomar um porre pra espairecer. Se alguém a encontrar por aí, por favor, diga a ela que é assim mesmo. Quando as respostas já parecem dadas, a vida vem e bagunça tudo, mudando as perguntas. Tudo bem. Eu prefiro mesmo as perguntas às respostas.


Ah, e não se esqueça: mande que ela volte já pra casa. Nessa nova fase da "lua", temos muito a viver.

quinta-feira, 29 de outubro de 2009

Infinito momentâneo

Segunda-feira, 9h. Toca o despertador. Marina salta da cama apressada. Corre pra janela, abre a cortina e sente uma felicidade enorme em ver que - depois de dias de chuva - o sol apareceu. Apesar de seu signo ser influenciado pela lua, era o sol que regia seus humores. As pessoas costumavam dizer que ela tinha um brilho inexplicável e até estranho nos olhos. Quando essa observação era feita, ela ria. A firmeza de seu olhar, às vezes, assustava. Mas quem a conhecia um pouco mais via além. Via a ternura que ela guardava na alma. Aliás, Marina se divertia com os comentários a seu respeito, que costumavam se repetir. Achava graça também quando diziam que ela era duas pessoas diferentes: uma séria, outra sorrindo. O sorriso largo mudava completamente sua fisionomia: a deixava mais bonita. O fato é que, nos dias claros, a luminosidade do céu parecia invadir sua alma e fazê-la brilhar. Não porque fosse diferente das outras pessoas, mas porque sua alegria tornava-se contagiante.

Voltou pro quarto saltitando, com uma euforia quase infantil. Ele ainda dormia. Se aproximou devagar e beijou levemente os lábios dele. Gabriel abriu os olhos e retribuiu o beijo.

- Marina, pra que acordar tão cedo hoje? Você tá de folga. Volta pra cama!
- De jeito nenhum. Você já viu o sol? Levanta e vamos pra praia porque um dia lindo nos espera lá fora!
- Ah, eu quero dormir mais. Tá tão bom...
- Então tá, eu vou. Fica aí dormindo, perdendo tempo.

Ele achou graça da afirmação e retrucou.

- Porque você acha que dormir é perda de tempo? Dormir é bom.
- Ah, sei lá. O dia tá passando e eu vou ficar dormindo? Fico com a sensação que estou perdendo um pedacinho da minha vida...
- Essa sua vontade de viver é impressionante. É uma coisa linda! Mas, pô, vai com calma! Acho que é por isso que você tem insônia...
- Ah, que legal. Não sabia que você também era médico! Devia relatar seu diagnóstico ao Dr. Ricardo. Talvez ele se surpreenda com a sua descoberta e me receite algum remédio que faça efeito!
- Vai ficar debochando de mim?
- Vou sim!

Gargalhando, ela se despiu. Enquanto ele a observava com um sorriso tímido nos lábios, ela colocava o biquíni.
Repentinamente, ele levantou um questionamento (para ela impensável naquela hora da manhã).

- Você acha que o amor dura pra sempre?

Ela sentou e ficou em silêncio.

- O que foi?
- Tô pensando na resposta! Ah, todo mundo diz que o amor verdadeiro dura pra sempre. Mas minhas experiências me mostram o contrário...
- Tá, mas no que você acredita?
- Posso responder depois? Sabe o que é? Eu procuro não pensar sobre isso. Então, não tenho uma resposta pra te dar agora.
- É que eu fico pensando: se o amor acaba, é porque não era amor? Se o relacionamento acaba e o sentimento não acaba nunca, como é que se resolve? Melhor esquecer e perceber que nunca amou ou correr o risco de continuar amando e não esquecer nunca mais?
- Ai, que difícil! Sinceramente, não sei o que dizer...

Por um momento, uma sombra invadiu o semblante de Marina. Queria saber o que fazer com aquele ponto de interrogação.

- Quando eu for bem mais velha e já tiver vivido muito e descobrir essa resposta, vou te procurar onde você estiver só pra te contar, tá?

Achando a resposta dela engraçada, doce e ao mesmo tempo ingênua, Gabriel abriu um largo sorriso. Aquele sorriso era a calma de que ela tanto precisava.

Ele a puxou para a cama. Abraçado a Marina, cantarolou: “devagar, esquece o tempo lá de fora”. Ela continuou: “devagar, esqueça a rima que for cara”.

Enquanto ela cantava, ele se divertia com a ideia de que aquela resposta jamais viria. Simplesmente, porque não acreditava que ela existisse. Mas aquele instante infinito e sem pressa dos dois na cama valia mais do que qualquer resposta pronta.

quarta-feira, 21 de outubro de 2009

Por que estou aqui?

Quando decidi criar este blog, em agosto deste ano, tinha como único propósito voltar a escrever. Voltar a despejar neste papel virtual meus sentimentos, minhas opiniões, minhas angústias, minhas alegrias. Voltar a me entregar às palavras escritas que tanto amo. De corpo e alma. Com toda intensidade que existe dentro de mim.

Fico feliz em saber que há pessoas que têm disposição e paciência para ler o que eu escrevo. Pessoas que têm generosidade o bastante para tentar entender minhas palavras, ainda que, às vezes, não consigam ou não concordem. Não me julgo a dona da verdade. Até porque a verdade absoluta não existe. É irreal. O que existem são verdades. Cada um com a sua. Porque cada pessoa vê o mundo a sua maneira, com suas próprias lentes de tamanhos, profundidades e cores diferentes.

Ora falo dos meus sentimentos. Ora das minhas impressões sobre o mundo. Mas este mundo que escrevo é só meu. Não espero que as pessoas o vejam da mesma forma. Por isso, sempre valorizei os comentários. Eles são como partes integrantes do texto original independentemente se concordam ou não com os argumentos sustentados. Essa é a característica bacana do blog, da internet: interação. As opiniões diversas só enriquecem os debates.

Com o intuito de oferecer a maior liberdade possível a quem se interessasse em ler o que aqui está escrito, não utilizava o recurso de moderação de comentários. Achava que seria desnecessário. Pressupunha que as pessoas estariam interessadas em trocar ideias e não gerar conflitos.

Mas, infelizmente, a partir deste momento passarei a utilizar o recurso de moderação de comentários. Por consideração às pessoas que têm visitado o blog e me presenteado com suas observações construtivas, vou explicar o motivo. Hoje tive uma surpresa desagradável: uma pessoa com um login falso deixou um comentário extremamente grosseiro, usando palavras agressivas em relação a mim no post “Faroeste carioca”.

Minha primeira reação foi a de ficar profundamente triste por essa agressão gratuita. Mas minha tristeza durou pouco tempo porque estou procurando exercitar minha capacidade de ignorar pessoas e fatos pouco ou nada relevantes para a minha vida. Faço isso com um único objetivo: ter paz.

Eu já tive um blog antes (Cartas Anônimas) e o apaguei, no início do ano, justamente por causa desse mesmo tipo de comentário. Só que dessa vez, a situação é diferente. Eu estou diferente. Não vou abrir mão da minha liberdade de me expressar.

Essa pessoa sequer teve a decência de “mostrar sua cara”. Agiu de maneira leviana, rasteira e, principalmente, covarde. Mas se esqueceu de um detalhe: as nossas palavras carregam marcas individuais como impressões digitais. O texto diz quem você é.

Para você, que parece estar mais preocupado com a minha vida do que com a sua, deixo um recado. Sinto muito que uma relação de carinho, admiração e amizade (pelo menos da minha parte) tenha chegado a esse ponto: desrespeito. Tudo porque você transferiu para mim a mágoa que nutre por uma outra pessoa. Tudo porque você não aprendeu a lidar com a sua dor.

O sofrimento faz parte da vida. Não há no mundo quem nunca tenha sofrido. Mas a dor provocada pelas decepções e pelas dificuldades da vida não pode ser usada como desculpa para que as pessoas se sintam no direito de ferir as outras. Nos momentos de sofrimento, a vida nos impõe dois caminhos: crescer diante dos obstáculos ou assumir para si a posição de vítima do mundo. Por algum motivo que desconheço, algumas pessoas preferem se vitimizar. Preferem ser tratadas como coitadas. Preferem despertar pena em vez de admiração.

No último ano, passei por momentos sucessivos de sofrimento. Um após o outro. Mas eu escolhi seguir em frente. Amadurecer. Escolhi ser forte. Opção que muitas pessoas fazem todos os dias. Nunca quis ferir alguém apenas porque estava sofrendo. As pessoas não têm culpa das adversidades que surgiram na minha vida. Não podemos transferir para os outros a responsabilidade pela nossa eventual infelicidade. Porque a felicidade só depende de nós.

Eu não desejo mal a você. Apenas não o quero mais perto de mim. Não desse jeito.

Espero que, em breve, você encontre o caminho da luz.

A todos que visitam o Efeito Borboleta, quero deixar claro que críticas e sugestões serão sempre muito bem-vindas e eu pretendo publicar todas. Apenas os comentários de baixo nível (se ocorrerem novamente) serão deletados. Peço a compreensão de todos.

Não deixem de ler o post "Faroeste carioca" (abaixo) e expressem suas opiniões. A gente se encontra por aqui.

Um beijo grande a todos!

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

Faroeste carioca

Queria estar aqui para falar amenidades. Aliás, notícias boas não faltam. Mas nem tudo são flores. Como jornalista e especialista em Políticas Públicas de Segurança não posso ignorar os confrontos em favelas da Zona Norte do Rio, iniciados com a tentativa de invasão do Morro dos Macacos. Estou tentando até agora entender de que forma o secretário de Segurança Pública, José Mariano Beltrame, pretende justificar o que ocorreu usando a frase "foi um ato desesperado dos traficantes". Desculpe, mas eu, como cidadã, não só esperava como tinha o direito de ter uma explicação plausível para o fato de a polícia saber com antecedência de que ocorreria uma tentativa de invasão da favela e não conseguir conter a ação dos criminosos e evitar mortes de inocentes.

Neste caso, ficam várias perguntas no ar. Qual foi a qualidade das informações que a Secretaria de Segurança recebeu do setor de inteligência? Elas, de fato, permitiriam às forças de segurança planejar uma ação para impedir os criminosos? A polícia dispunha dos meios necessários para isso? E mais: tem superioridade tática que permita ações preventivas desse tipo?


Sem dúvida o que mais chamou a atenção neste episódio foi o fato de um helicóptero da Polícia Militar - com seis tripulantes a bordo - ser abatido por traficantes levando à morte de três policiais e deixando outros três feridos. Essa não é primeira vez que um helicóptero da polícia é atacado por traficantes. Além disso, os criminosos possuem há tempos armamento antiaéreo.



Então, por que utilizar helicópteros com a finalidade de combate? A polícia do Rio é a única no mundo que faz esse tipo de uso. Os helicópteros devem ser usados para resgate e para monitoramento. E há explicações concretas para isso. A primeira e a principal delas - na minha opinião - é o fato de que o tiro da polícia tem que ter destino certo. As forças estatais de segurança têm um compromisso com a sociedade no exercício do mandato público. Não se pode admitir que a polícia dispare tiros a esmo como os traficantes. E os helicópteros, como bases móveis, não são 'plataformas' seguras para esse tipo de confronto.



Ao utilizar um helicóptero em confronto direto com criminosos, a polícia coloca em risco seus agentes e a população. Nesse caso específico, se o piloto não tivesse tido controle suficiente da aeronave para fazer o pouso forçado na Vila Olímpica de Sampaio, o helicóptero poderia ter caído sobre casas, prédios ou no meio da rua e a tragédia seria muito maior.



São essas as questões que a cúpula da Segurança deveria analisar para descobrir qual foi o erro na preparação para o que estava por vir e para dar satisfações à sociedade. Isso mesmo, dar satisfações. Por mais que eles abominem a ideia de ter que explicar e justificar suas decisões à população, esse é o dever do agente público.



Historicamente, as autoridades de segurança tendem a assumir uma postura arrogante, deixando nas entrelinhas que suas decisões não devem ser questionadas. Por outro lado, população se exime da responsabilidade de cobrar. Normalmente, esse papel é desempenhado pela imprensa. Essa falta de compromisso mútuo gera problemas como desmandos, uso excessivo da força e abuso de autoridade.



O policiamento é público porque pressupõe um pacto consensual entre governantes e cidadãos. A população não pode dar um "cheque em branco" para que as autoridades preencham como bem entenderem. Isso é o mesmo que jogar uma partida de futebol sem regras. Os policiais ficam "perdidos" diante da falta de procedimentos oficializados e a população fica insegura sem saber o que virá pela frente.



É por causa desse tipo de postura que nós temos de ver o governador do Rio, Sergio Cabral, afirmar a cada caso grave na área da segurança que a política do governo não vai mudar. Meu Deus do céu! Será que eles não percebem que há algo errado? Claro que não, afinal, as UPPs - Unidades de Polícia Pacificadora - são o grande sucesso deste governo. Só queria entender qual é a vantagem de expulsar traficantes de um morro e deixá-los fugir para outras favelas? Ao meu ver, é trocar seis por meia dúzia.



Agora, o clima de vingança se instalou e os próximos dias prometem ser bem violentos a julgar pela frase usada pelo chefe da Polícia Civil, Alan Turnowski: "Isso não vai ficar assim. Nunca um ataque contra a polícia ficou sem resposta". Na última vez que esse governo decidiu "se vingar" do assassinato de dois policiais militares em Oswaldo Cruz iniciou uma megaoperação no Complexo do Alemão que provocou a morte de 19 pessoas num único dia: 27 de junho de 2007. Depois disso, o conjunto de favelas passou meses ocupado pela polícia e os confrontos com traficantes se estenderam.



Pior do que a população não cobrar explicações das autoridades é legitimar ações descabidas com o uso excessivo da força e nenhuma de inteligência. Legitimar execuções. Eu confesso que não aguento mais ouvir a frase: "eu acho que a polícia tem que subir o morro e matar mesmo". Esse tipo de pensamento me irrita cada vez mais. Embora eu, cada vez mais, evite discutir com quem parece não ter a mínima noção da gravidade do que está dizendo. Às vezes, eu até tento argumentar, mas, normalmente, as pessoas que pensam assim têm uma certa dificuldade de ouvir qualquer outro tipo de opinião. São radicais e elitistas. Sim, porque você nunca ouvirá um morador de favela falando esse tipo de absurdo. E pasmem, tenho ouvido com frequência jornalistas repetindo essas frases de senso comum.




Num estado democrático de direito, esse tipo de pensamento é inconcebível. Existem leis e elas devem ser cumpridas. As ações da polícia devem ser legítimas (consentidas por todos) e legais (obedecendo às leis institucionalizadas). O Estado não tem carta branca para matar. No Brasil, não há pena de morte. A partir do momento que nós aceitamos que um criminoso seja executado em vez de preso estamos assumindo o risco também de que um dia sejamos executados se "confundidos" com criminosos. Os altos números de registros de auto de resistência (quando o criminoso supostamente reage e é morto pela polícia) mascaram execuções. Isso é de conhecimento público. Essas ações estão dentro da lei? Obviamente não.

E para percebermos como isso é grave, vou relatar um fato simples. Recentemente, voltava de uma festa com uma amiga e o irmão dela e passamos por uma blitz em Copacabana. Os policiais acharam que o carro não iria parar e, por isso, fomos abordados com certa violência. Com fuzis apontados para os nossos rostos tivemos de sair do carro e apresentar documentos. O policial nos explicou o motivo da abordagem: estavam procurando um Pegeout igual ao do irmão da minha amiga e como o carro tinha insulfilm não conseguiram ver quem estava dentro do veículo. Imagine se eles decidissem atirar? Matariam três inocentes.



Outro exemplo é o caso do menino João Roberto morto com um tiro na cabeça disparado por policiais que "confundiram" o carro da mãe dele com o de criminosos. Na ocasião, ação da polícia foi criticada. Mas se dentro do carro estivessem quatro negros (traficantes ou não) a ação teria sido considerada bem-sucedida? Provavelmente. Mas - para a surpresa de todos - tratava-se de uma família de classe média: uma mãe e dois filhos pequenos. Esse é o risco que assumimos ao legitimar ações fora da lei. Mas não é de se espantar, afinal, estamos numa sociedade que comemora mortes. Salve-se quem puder!



Ps: O que está ruim pode piorar. O Complexo do Alemão está sem policiamento há mais de um ano por motivos políticos: não atrapalhar o andamento das obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Isso porque 2010 é ano de eleições. Esta situação é uma bomba-relógio prestes a explodir. Ah, isso não é uma profecia, mas uma conclusão lógica.


Este artigo foi publicado no Globo on Line: http://oglobo.globo.com/opiniao/mat/2009/10/21/faroeste-carioca-769798034.asp#



sexta-feira, 9 de outubro de 2009

Conflitos do coração

Luz e escuridão
Música e silêncio
Cheio e vazio
Tudo e nada
Amor e dor
Amanhecer eterno
Saudade que mata
Partida sem chegada
O romper de algo que não foi vivido
O abrir de olhos no sonho interrompido.


O sofrimento do amor castiga a carne e a alma. Mas o homem traz em si a capacidade de sentir. Foi feito para amar.


As feridas se fecham e deixam cicatrizes que não desaparecem, mas permitem ao corpo seguir. O tempo passa, leva embora a dor e traz consigo conforto, às vezes, desconfortável. Quando o coração se acalma, o sentimento é de querer viver tudo de novo como se fosse a primeira vez. Viver o novo. O amor é a bebida da alma. Tão sedutor e inebriante quanto uma taça de vinho.


- Garçom, traz mais uma, por favor!


Então, tudo recomeça porque o relógio não para e a vida não espera quem não sabe para onde ir.

Pensando sobre a alegria e a tristeza que andam de mãos dadas quando se vive um amor, deixo aqui a letra da música "Não deveria se chamar amor" que eu gosto muito e acho que reflete bem a união desses sentimentos paradoxais que, no fundo, dão sentido à vida e nos fazem pulsar.


O amor que eu te tenho é um afeto tão novo
Que não deveria se chamar amor
De tão irreconhecível, tão desconhecido
Que não deveria se chamar amor

Poderia se chamar nuvem
Pois muda de formato a cada instante
Poderia se chamar tempo
Porque parece um filme que nunca assisti antes

Poderia se chamar labirinto
Pois sinto que não conseguirei escapulir
Poderia se chamar aurora
Pois vejo um novo dia que está por vir

Poderia se chamar abismo
Pois é certo que ele não tem fim
Poderia se chamar horizonte
Que parece linha reta, mas sei que não é assim

Poderia se chamar primeiro beijo
Porque não lembro mais do meu passado
Poderia se chamar último adeus
Que meu antigo futuro foi abandonado

Poderia se chamar universo
Porque nunca o entenderei por inteiro
Poderia se chamar palavra louca
Que na verdade quer dizer aventureiro

Poderia se chamar silêncio
Porque minha dor é calada e meu desejo é mudo
E poderia simplesmente não se chamar
Para não significar nada e dar sentido a tudo

(Paulinho Moska)

quinta-feira, 1 de outubro de 2009

Que belo estranho dia pra se ter alegria

Tudo indicava que o amanhecer seria de lamento, uma espécie de profecia. Mas a vida é mesmo cheia de surpresas incríveis. A nostalgia da ilusão deu lugar à alegria dos pés no chão. A certeza de que a realidade pode ser ainda melhor que o sonho. A tristeza - que vez ou outra insistia em bater à porta e era expulsa sem cerimônias - saiu de fininho diante dos sorrisos despretensiosos distribuídos ao acaso. As lembranças pálidas do que foi cederam espaço à urgência sem pressa de quem vive o novo saboreando cada segundo como se fosse o último. Alma dançante, mente insana, corpo ardente. O dia passou como uma estrela cadente, deixando um rastro de brilho no ar...

quarta-feira, 23 de setembro de 2009

Literatura e internet de mãos dadas

Vivemos num tempo em que tudo muda muito rápido, as novidades nos sufocam e impõe um ritmo frenético de adaptação dos indivíduos. Os objetos ficam obsoletos do dia para noite e os relacionamentos, cada vez mais instantâneos (É impressão minha ou as pessoas estão ficando assustadoramente superficiais? Aliás, isso é uma constante na minha vida: as pessoas me chocam diariamente pelos mais variados motivos!). Tanta velocidade gera uma série de conflitos nos indivíduos, mas isso é assunto pra outro post. A questão agora é o fato dessa velocidade afetar nossa relação com a literatura e a arte, que quase são engolidas pela tecnologia.

Um dos debates mais interessantes no Café Literário na Bienal do Livro foi sobre o futuro do livro e a possível combinação da literatura com as ferramentas da internet. Em meio às novidades tecnológicas tão atrativas aos olhos de crianças e adolescentes, o livro foi jogado para escanteio. Sabiamente, os autores têm adotado a velha tática: se você não pode com o inimigo, junte-se a ele. Melhor do que isso, estão fazendo da internet sua melhor amiga. Na discussão, os escritores Carola Saavedra, Ivana Arruda e Marcelino Freire contaram como eles utilizam essas ferramentas para divulgar e atrair público para os insubstituíveis (na minha opinião) livros de papel. Eles anunciam lançamentos, divulgam eventos literários e conversam com os leitores virtuais. Alguns autores vão mais longe: postam trechos dos livros na internet como aperitivo. O gostinho de quero mais surge e os internautas vão atrás do prato principal: o livro. Já tem até clássico sendo recriado no Twitter. O Globo on line publicou uma matéria no início do mês informando que a editora Penguin anunciou que comprou os direitos para o livro “Twitterature”, no qual dois estudantes universitários adaptaram para o Twitter “Medéia” e “Madame Bovary”. O livro deve ser lançado na Inglaterra em 5 de novembro.


A ideia é muito boa: fazer com que a literatura se aproprie dessas novas linguagens para renovar seu público e se manter viva. Algumas pessoas são radicais e dizem que essa interação é a única saída para o livro não desaparecer. Eu discordo. Aliás, essas teorias apocalípticas não me convencem. Quando a televisão surgiu, especulava-se que o rádio desapareceria. Isso não aconteceu. O rádio perdeu a majestade para a TV, mas as peculiaridades do veículo – como a velocidade da informação - o fizeram sobreviver, mantendo um público específico e cativo. Agora, as rádios também utilizam a internet como forma de conquistar novos ouvintes-internautas. A mesma discussão existe em torno do jornal impresso. A internet ganhou espaço? Sim. Os jornais se adaptaram com suas versões on line, mas não acredito que isso faça com que o jornal impresso deixe de existir.


Estaria enganada? Talvez. Essa é sempre uma possibilidade. Mas para tentar me defender, uso um fato (concreto): a 14ª Bienal do Livro atraiu 640 mil visitantes este ano, superando as expectativas dos organizadores. Ainda me defendendo, vou partir para o abstrato: nada substitui a magia de folhear um livro; de sentir o cheiro de novo ou velho; de ver as páginas incrivelmente brancas ou irresistivelmente amareladas; de devorar as palavras; de sentir na ponta dos dedos o poder do objeto que nos faz viajar sem sair do lugar; que nos faz viver o imaginável; que seduz; que faz pensar. Tecnologia nenhuma muda minha rotina diária noturna (que tem ares de ritual): levantar a coberta, ajeitar o travesseiro, recostar e abrir um livro.


Lembro da minha mãe lendo para mim clássicos infantis e outros livros nada clássicos como a história da mulher pequenininha, que tinha uma casa pequenininha, usava um sapato pequenininho...


Essa atitude carinhosa da minha mãe fez com que eu tomasse gosto pela leitura. Esse é um hábito que precisa ser incentivado. Por isso, eu acredito que depende de nós passar adiante o interesse pelo livro e mantê-lo vivo.


E por falar em interações com a internet, hoje eu vou deixar aqui uma dica do meu amigo Maurício Martins, âncora da CBN: a rádio GNT (http://www.radiognt.com.br/). A programação é de bom gosto e bem eclética: vai de Gilberto Gil, passando por Titãs, Bon Iver e Little Joy. Vale a pena conferir!

terça-feira, 15 de setembro de 2009

A última dança

Como bailarina e fã, não poderia deixar de registrar aqui meu pesar pela morte do ator Patrick Swayze ontem vítima de câncer no pâncreas. Trata-se de uma perda irreparável para o cinema, mas, principalmente, para a dança. Bailarino clássico de formação, Swayze deixou o ballet profissional por causa de lesões provocadas pelo futebol americano. A partir daí, se dedicou à carreira de ator. Tinha um estilo próprio e inconfundível. Misturava a 'base' clássica com influências da dança moderna e de rua. Charme, presença e técnica aprimorada fizeram dele uma das referências da dança em Hollywood. Ele e a mulher, Lisa Nieme, fizeram uma belíssima apresentação no World Music Awards de 1994 que pode ser encontrada facilmente no YouTube. Vale a pena assistir!

A maioria das pessoas se lembra de Patrick Swayze em Ghost, quando fez grande sucesso contracenando com Demi Moore. Mas, o meu filme preferido é, sem dúvida, Dirty Dancing (1987). Na produção, ele contracena com a atriz e bailarina Jennifer Grey. O longa, dirigido por Emile Ardolino, tornou-se um indiscutível clássico da época e Swayze foi indicado ao Globo de Ouro de melhor ator em musical pelo personagem Johnny Castle. Versátil, ele também compôs e interpretou uma das canções que fazem parte da trilha sonora do filme: She's Like the Wind.


Para quem não se lembra ou quer rever, segue o link da cena final de Dirty Dancing. Swayze e Grey dançam ao som de The Time of my Life, música vencedora do Oscar de melhor canção original. A coreografia é um primor!

http://www.youtube.com/watch?v=D3L2jz7N_Dk&feature=related

sexta-feira, 11 de setembro de 2009

A política dos 'limpinhos'


Pizzaria Guanabara, Leblon, 23h30. Estamos em seis amigos, quatro deles importados do coração financeiro do país via ponte área. Escolhemos uma mesa na varanda para observar a movimentação do bairro (cheio de Marias e Pedrinhos ligando a todo momento!). Na mesa atrás de nós, uma pessoa fumava e, de cara, já causou indignação em um dos nossos amigos visitantes. “O que é isso? O cara tá fumando embaixo do toldo? Não pode!”, disparou. Minha primeira reação foi pensar: “Poxa, mas a gente tá quase na rua, né? Não é tão grave assim!”. Inconformado, o rapaz questionou: “Aqui não tem a lei contra o fumo não? Em São Paulo, o negócio é sério!”. Uma amiga e eu – as únicas cariocas na mesa – respondemos: “tem mais ou menos, mas falta fiscalização”. Típica resposta de brasileiro. A lei vale mais ou menos, até certo ponto, depende do referencial, das condições normais de temperatura e pressão, sabe como é?

Depois disso, o assunto mudou várias vezes: trabalho, amizades, planos para o dia seguinte e o grande tema da noite: os homens devem ou não pagar a conta? Esse foi um debate intenso e muito interessante, mas fica pra outro post. A questão é que - como de costume - alguém solta uma frase e eu viajo nela por horas sem ponto de parada (quase o Fantástico Mundo de Bob, lembra deste desenho?). A indignação do meu amigo em relação ao fumante ficou na minha cabeça. Tive até pena do cidadão. Ele estava em um local praticamente aberto. Havia apenas um toldo sobre a cabeça dele. Cá entre nós, será que o toldo faz assim tanta diferença?

A lei antifumo bane o uso de cigarro e derivados de tabaco em ambiente de uso coletivo – público ou privado – em todo o estado de São Paulo. A lei não prevê punição ao fumante infrator, mas os estabelecimentos podem ser multados ou até interditados pelos órgãos de Vigilância Sanitária. A medida provocou um clima de controle social nos ambientes coletivos. De um lado, pessoas dispostas a denunciar qualquer ‘desvio de conduta’. De outro, as que têm medo de serem denunciadas e passarem por constragimento. Com isso, desde que a lei entrou em vigor, com fiscalização rigorosa, os fumantes se tornaram alvo de duras críticas e olhares atravessados, vistos quase como cidadãos de terceira categoria. Já que os termos indianos estão na moda por causa da novela-fenômeno, que tal classificar os fumantes como ‘dalits’? Dentro da postura higienista da lei, a adicção à nicotina faria dos fumantes criaturas impuras. Isso é muito louco! Basta pensarmos que os Estados – inclusive o brasileiro – até pouco tempo não apenas deixavam de se posicionar em relação às mortes provocadas pelo fumo como apoiavam as indústrias tabagistas. Quem não se lembra das propagandas milionárias recheadas de gente bonita e com muito glamour? Tudo para incentivar o consumo de um produto que é taxado com impostos altíssimos.

Não se trata de defender o fumo em ambientes coletivos. Isso seria um desrespeito com aqueles que não querem ser incomodados pela ‘fumacinha do mal’. A justificativa é plausível: o fumo passivo é a terceira causa de morte evitável no mundo. O problema da lei, na minha opinião, é proibir o fumo também em ambientes segregados. Nenhum estabelecimento comercial pode ter espaço para fumantes. Ora, se existe um espaço fechado destinado a fumantes, todos que estiverem ali são, obviamente, ativos, ou seja, não há fumo passivo neste local. Logo, não vejo motivo para proibir o fumo em ambientes segregados. Ah, esqueci! A justificativa do governo é que se pretende através da lei promover uma mudança de comportamento para salvar vidas. Mas, não há comprovação empírica de que a repressão cure adicção. Ao contrário.

O fumo deveria ser tratado como os demais problemas de saúde pública por meio da conscientização do males provocados pelo cigarro e da oferta de tratamento para quem desejar abandonar o vício. Aquela campanha que estampa fotos chocantes (um homem com disfunção erétil, outro traqueostomizado, dentes podres, etc.) nos maços de cigarro, por exemplo, é sensacional! Muito elogiada até pelos fumantes. Acesso à informação é o mínimo que se espera num estado democrático de direito. Mas, as autoridades decidiram que podem interferir na saúde dos indivíduos, o que me soa uma arbitrariedade. Se o sujeito quer fumar, fumar e fumar até morrer é um direito que lhe cabe. A individualidade é um dos pilares do capitalismo e nós não fazemos parte da sociedade capitalista? Portanto, nenhum governo pode se apropriar da subjetividade de um indivíduo. Dizer o que pode ou não lhe dar prazer. Impor formas de se alcançar a felicidade. “Se você não fumar, será mais feliz”. Isso é inconcebível. Até porque não pode haver felicidade sem liberdade. O próximo passo seria criminalizar a nicotina? Pra gerar tráfico e violência? Não me parece um raciocínio sensato.

A obesidade também é uma epidemia mundial. Daqui a pouco, todos serão obrigados a fazer dieta e praticar exercícios físicos. As autoridades pretendem instituir por meio de leis que só os ‘limpinhos’ têm direitos? E os ‘sujinhos’ serão banidos? Estes vão embora (sabe Deus pra onde) e levam consigo as singularidades e excentricidades dos seres humanos. Acabam-se os prazeres, a liberdade, a felicidade. E tudo fica um tédio.

Antes que alguém se enfureça: eu não fumo, faço dieta e pratico exercícios todos os dias. Porque quero, não porque me foi imposto. Meu vício é o chocolate. Pois é, cada um com seus problemas!

terça-feira, 8 de setembro de 2009

Música para a vida


Passo pela gente apressada, entre vozes e gargalhadas bêbadas. Podem me ver, mas não enxergam. Sem rosto nem classificações. Sem a preocupação de parecer, apenas ser. Será que algum dia houve?


No caminho, as sensações. Pés no açúcar granulado flutuam sem direção. O vento segura minha mão e me guia, como uma mãe a seu filho. Sento e espero no espaço desértico. Holofote natural ao longe ilumina a visão do vazio. Reparo com olhos de primeira vez. Cada detalhe de cor; cada tom melódico da sinfonia viva; o cheiro; o gosto. No cenário azul escuro, o movimento, ora suave e lento, ora forte e agressivo. O carinho da brisa e o sussuro em ritmo de mantra. Quase um tributo ao bater do coração. Em meio à tamanha grandeza, por um instante as palavras de Neil Gaiman surgem na minha mente: "que cada um de nós sempre dê ao demônio o que lhe é merecido". O silêncio musical embala o passar do tempo.


A noite se despede, querendo ficar. A bruma surge no horizonte de onde meus olhos não desviaram por um só segundo. Amanhece o dia e os primeiros raios de sol quentes e vibrantes anunciam um novo concerto. O mar - fiel companheiro na viagem existencial - ainda está ali, ansioso para sentir meu corpo. Mergulho ao meu encontro. O sal, que um dia curou feridas, agora revigora a alma.


Chega o momento de ir. Pergunto a uma senhorinha que faz seu exercício matinal no calçadão: "que horas são?". Ela sorri ao me ver completamente ensopada e direciona o olhar para o relógio. Antes que a resposta seja dada, eu sigo para casa. Não importa. Não há o que esperar nem desesperar. Há paz. Poderia até comer um algodão doce.

domingo, 6 de setembro de 2009

Ela disse 'sim' ao amor

Sábado, 5 de setembro de 2009, dia histórico para mim e para meus amigos. A doce menina que sofrera as dores do coração encontrou um amor que deseja para a vida toda.

Eu - que sou avessa a cerimônias de casamento - chorei e muito. Depois de tantas dificuldades e imprevistos inacreditáveis (dignos de matéria jornalística ou do antigo quadro do Fantástico, Retrato Falado), as portas da igreja se abriram e ela surgiu: linda como uma princesa e com o sorriso da mais pura felicidade. Minha vontade era de gritar: "amiga, nós conseguimos!". O mérito é todo dela. Digo 'nós' porque estivemos ao seu lado em cada momento e fizemos o possível e o impossível para 'dar um jeito' no destino que parecia estar nos pregando uma peça. Com as amigas do peito é assim: o problema de uma é o problema das três! Choramos, rimos, lutamos... juntas! Ah, e se depender da gente, nenhum caminhão vai ficar no seu caminho! rs


Enquanto a maioria foge - por medo ou egoísmo - ela disse 'sim' desde o início e teve a coragem de seguir o conselho de Drummond e não deixar o amor passar. Felicidade a vocês sempre!

É o que eu falo: tudo sempre dá certo no final... uma por todas; todas por uma!

quinta-feira, 3 de setembro de 2009

Silêncio sonoro

Passa.
Volta.

Passa de novo.
Sem disfarçar.
Mudam os dias; a mesma visão.
Olha, não fala.
Repara, não fala.
Observa, não fala.
Sem mais, está dito.
Fala: com o olhar.

Curiosidade à primeira vista.
Resistir ou se deixar levar?

quarta-feira, 26 de agosto de 2009

As voltas do tempo

De mente confusa e coração turbulento, Bianca nunca fora dada a amores. Seu espírito sedutor a levara a falsas paixões, tão intensas quanto fugazes. Acreditara na liberdade e pensara a estar alcançando em plenitude não permitindo a si mesma envolver-se com um homem. Seguia fielmente seu paradigma. Mas, isto foi antes. Antes de seus caminhos se cruzarem com os de Henrique.

Com uma combinação inusitada de doçura e força, Henrique rompeu as defesas de Bianca logo no primeiro olhar. No primeiro sorriso. No primeiro beijo. Na primeira noite. Ela não podia crer que isso fosse possível e pensava ter tudo sob controle. 'Em breve isso terá terminado' - dizia a si mesma. Estava enganada. Os dias passaram e, depois, os meses. A cada fração de segundo ao lado de Henrique, seu corpo era tomado por um turbilhão de sensações.

Ardia em paixão e já sentia o cheiro do amor. O pânico surgiu. Medo de perder Henrique. Medo, principalmente, de perder a si mesma e sua tão adorada liberdade. Mantendo a racionalidade - traço determinante de sua personalidade - Bianca tomou uma atitude intempestiva: afastar-se de Henrique. Não teve dúvidas e o deixou, acreditando ser uma decisão acertada e tendo em mente que um suposto erro poderia ser reparado. Afinal, voltar atrás é sempre uma possibilidade.

Bianca mergulhou novamente em seus 'amores' efêmeros e superficiais. Mas, nenhum podia ocupar o vazio deixado por ele. Sua procura era incessante e sem sucesso. Na verdade, nem ela mesma sabia o que procurava. Mas, sabia que não encontrava Henrique. Os dias passaram, depois, os meses.

Em um dia frio, acordou ao lado de um homem. Olhou para o seu rosto e só o que conseguia sentir era 'estranheza'. Viu os pingos caírem na janela. Lembrou do beijo de Henrique com gosto de chuva. Na ocasião, não fugiram da tempestade. Nem adiantaria, ela estava dentro deles. Não correram, ficaram. Se molharam, se olharam, se sentiram. As lembranças quase permitiam que Bianca tivesse a presença de Henrique. A jovem percebeu em um instante o que deixara para trás. O motivo? Covardia.

Dois anos depois, ela sentava para escrever-lhe uma carta. Queria saber notícias de Henrique. Saber ao menos onde ele estava para tentar reparar o que (agora) julgava ser um erro, de fato. Tinha medo de que ele não a compreendesse, sem saber que - durante esse tempo - Henrique dizia em silêncio para si mesmo: "volte".

"Meu amado Henrique,

Tantas noites passaram sem que eu admitisse o quanto o calor do seu corpo me faz falta e como minha alma parece faltar um pedaço: colcha de retalho que não pode ser remendada. (...) Não pedirei desculpas. Digo apenas que sempre há tempo para mudar. E o meu tempo chegou.

Vou reencontrá-lo.
Vou amá-lo, sem vergonha.

Espere por mim".


Depois de ler a última frase, Rita dobrou o papel e o colocou novamente no envelope endereçado a seu irmão. Com aperto no peito, não pôde conter as lágrimas. O sentimento era de pesar pelo amor que Henrique não tinha conseguido viver e jamais viveria. Era tarde. Nem sempre dá pra voltar atrás.

quinta-feira, 20 de agosto de 2009

Presságio


O efeito borboleta se refere à Teoria do Caos desenvolvida pelo cientista Edward Lorenz (morto no ano passado) ao tentar explicar porque é tão difícil fazer previsões meteorológicas. O efeito foi analisado pela primeira vez em 1963. Para sustentar sua teoria, Lorenz usava o exemplo da borboleta cujo constante bater de asas poderia provocar um tufão em lugares distantes do ponto onde ela se encontra.

Ao desenvolver modelos matemáticos meteorológicos, Lorenz disse que um sistema tão dinâmico como atmosfera podia guardar enormes e desconhecidas consequências. Essas conclusões abriram um novo campo de estudos e atingiram quase todos os ramos da ciência. No caso específico da meteorologia, revelaram que é impossível prever o tempo com certo grau de precisão além de duas ou três semanas.

Peço licença para fazer aqui uma analogia: assim também é vida. Os pensamentos, as palavras e as atitudes têm força e provocam consequências e repercussões, muitas vezes, inesperadas. Para que magoar, ferir, fazer o mal ou simplesmente se recusar a ajudar? Parece incrível, mas existem pessoas com uma enorme capacidade de afastar as outras, desfazer sentimentos, adormecer paixões - destruir a vida a sua volta.

Mas, por sorte, há outros caminhos a se seguir. Por sorte, as pessoas não são iguais. Há quem prefira doar-se, compreender a si, aos outros, arder em paixões, amar, ao menos tentar. Sentimentos e atitudes capazes de transformações inimagináveis. Chico Xavier - que dispensa apresentações - escreveu: "o bem que praticares, em algum lugar, é teu advogado em toda parte". É como se fosse um "efeito borboleta"...

Depois de longos meses de muita reflexão, o dia hoje amanheceu diferente. Fui acordada pelo sussuro do vento: um presságio. Acostumada à luz do sol, minha jabuticabeira se deliciou com a chuva. Corri para salvá-la, mas, sinceramente, acho que ela não queria ser salva. Queria sentir. Assim como eu quero me molhar, me queimar, me arriscar - viver. E eu que andei muda, com versos calados, volto a escrever. Sentindo amor da cabeça aos pés e com uma doce certeza: por não poder fazer tudo não me recusarei a fazer o pouco que posso. Começa hoje um novo tempo!